APENAS um mero detalhe não nos proporcionou a histórica circunstância de vermos o maior pugilista de todos os tempos a conceder a medalha de bronze a Lurdes Mutola, naqueles escaldantes Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996. Os lugares alcançados nas duas anteriores edições, em Seul e Barcelona, já indiciavam o pódio olímpico para Lurdes e o galardão chegou precisamente quando os jogos do Barão completavam o simbólico e representativo centenário.
Lurdes Mutola correu a distância dos 800 metros em 1.58.71, naquela final épica no “Centennial Olympic Stadium”, onde também discursou Bill Clinton na cerimónia de abertura. A sua amiga cubana, Ana Fidelis Quirot, ficou com a prata, mas foi por menos 60 centésimos de segundo, e a russa Svetlana Masterkova arrebatou a medalha de ouro, com menos de um segundo que a nossa menina de ouro, numa corrida seguida presencialmente com muita emoção pelos quase 100 mil espectadores e outros milhões de telespectadores de 214 países, confirmando a teoria de que a prova dos 800 metros é a competição rainha no atletismo, a par das dos 100 metros.
O detalhe a nos referíamos logo à cabeça desta carta ao Pierre, refere-se precisamente ao facto de o grande Classius Marcellus Clay Jr., Muhamad Ali para os mais afoitos à nobre modalidade, estar a atravessar, já em 1996, uma fase difícil da sua vida, padecendo do mal de Parkinsom, mas ainda assim tendo sido a principal figura dos Jogos de Atlanta ao acender a tocha olímpica na Cerimónia de Abertura, com as mãos trémulas e fragilizado pela doença, mas visivelmente emocionado.
Apenas este “pequeno detalhe” da doença de Mohamed Ali impediu que Classius Marcellus Clay Jr. estampasse a primeira medalha olímpica de Moçambique no peito orgulhoso de Lurdes Mutola e nos anais da história de Moçambique, que nesta mesma edição de Atlanta entrou para as contas finais do medalheiro olímpico, sendo verdade que num modesto 71.º lugar, mas ainda assim de grande visibilidade para quem estava, claramente, a devorar pistas e a alimentar o sonho dos moçambicanos.
Nesta mesma edição, Argentina da Glória seria desclassificada, um perdoável percalço para uma atleta que se iniciara nas lides olímpicas justamente em Barcelona, mas apesar disso sempre à sombra de Lurdes Mutola, até porque correndo precisamente as mesmas distâncias, os 800 e os 1500 metros, nesta última reconhecidamente de grande utilidade (estamos a falar de Tina da Glória) como a “lebre” que muitas vezes atraiu para a exaustão as adversárias da sua amiga Lurdes.
E antes de nos despedirmos do amigo Pierre, lembramo-nos, desta vez, de nomear todos os atletas moçambicanos presentes nos jogos da Catalunha, pois que deles nos esquecemos, impelidos pela emoção de ter estado lá o “dream time”, aqueles amigos da Lurdes que atravessaram o Atlântico à cavaqueira e a bordo de um “boing” da Delta…
Pois bem, comecemos por Barcelona que, para além de Lurdes e Tina, integravam ainda a delegação olímpica de Moçambique o Jaime Nharimue, meio-fundista dos 400 metros e os nadadores Sérgio Faftine, dos 100 metros, Mariza Gregório, dos 100 metros bruços, e José Moisés Mossiane, dos 50 metros livres. Já em Atlanta, objecto desta missiva, para além da incontornável Lurdes, que nos deu uma prenda de bronze, e de Argentina da Glória, o boxe esteve representado por essa legenda que dá pelo nome de Lucas Sinóia, e ainda por Leandro Jorge.
PS: De propósito, caro Pierre, não abordamos aqui o atentado no “Centennial Olympic Park”, a poucos metros da Vila Olímpica, que manchou os Jogos de Atlanta. É que, sabes, essa coisa de atentados nos indispõem, até porque nem todos somos Donald Trump para delas sairmos ilesos, com apenas uma orelha chamuscada de pólvora…
